Caro Filoteu
Diante de um alguém, que na multidão pede a Jesus para ser árbitro na divisão de uma herança (ver Lc 12, 15), a resposta do Senhor surge inesperada e surpreendente:
Homem, quem me encarregou de julgar ou de dividir vossos bens? (Lc 12, 14).
Por que será que Jesus se nega a ser mediador na contenda? Ao invés de resolver um caso particular, Nosso Senhor vai à raiz do problema (aliás, uma maneira bastante concreta para encontrar a solução dele). E vem uma indicação preciosa:
Atenção! Tomai cuidado contra todo tipo de ganância, porque mesmo que alguém tenha muitas coisas, a vida de um homem não consiste na abundância de bens" (Lc 12, 15).
Palavras precisas, importantes, essenciais. Uma grande fonte de males, males sem fim, é a ganância pelos bens materiais, a vontade de acumular coisas. Os bens deste mundo não pertencem ao homem, mas a Deus que os destinou para todos e não só para alguns espertos ou competentes em juntar dinheiro. Quem acumula só para si inverte o plano do Criador. Acumular então é roubar, é administrar mal, porque, no fundo não somos proprietários, mas administradores. No dia da morte, devolveremos tudo ao proprietário legítimo. Nada temos, nada somos. Paulo faz um alerta importante a respeito disso:
Porque o amor ao dinheiro é a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se traspassaram a si mesmos com muitas dores (1Tm 6, 10).
O que temos, apenas recebemos e cuidamos para um dia devolver ao verdadeiro senhor das coisas. O apóstolo afirma com muita propriedade:
Porque, quem te faz diferente? E que tens tu que não tenhas recebido? E se recebeste, por que te glorias, como se não o houveras recebido. (1Cor 4, 7).
As coisas, os bens são meios para fazer o bem, assim pensa Deus, assim quer Deus. Quem não assumir esta mentalidade fará destes bens o seu deus, seu miserável e traiçoeiro deus que o deixará, nem que seja na hora da morte, sem nada!
Entenda-se: Jesus não despreza os bens materiais, mas se opõe à dependência dos bens. O rico avarento a que se refere o Evangelho não é um desonesto, nem ladrão. É um trabalhador esforçado, previdente, consegue até ótimos resultados em seu esforço para produzir. E tudo isso, é bênção de Deus! Então, onde está a maldição? Vamos ao texto. Quando, por ocasião de uma grande colheita, o homem se deu bem, pensou consigo:
Vou derrubar os meus celeiros e construir maiores; neles vou guardar todo o meu trigo, junto com os meus bens. então, poderei dizer a mim mesmo: Meu caro, tu tens uma boa reserva para muitos anos. Descansa, como, bebe, aproveita! (Lc 12, 18-19).
Talvez poderíamos questionar: Mas, este homem não tem família, mulher, filhos, vizinhos, nem amigos e empregados? Provavelmente sim, mas não tem tempo para eles, não tem energias para empregar em favor delas, não se ocupa nem se preocupa com as pessoas, não tem sentimentos e por isso não vive o mundo da relação que gera comunhão. Só lhe interessa os que farão seus negócios prosperar. Seu pensamento gira em torno dos armazéns, das colheitas e dos cereais. Seus bens tornaram-se os seus ídolos e estes ídoloso destruíram tudo o que encontraram pela frente. Criaram um vazio ao redor dele, desumanizaram o coração completamente. o dito epulão tornou-se uma coisa, uma máquina que produz, faz contas. Para ele, "eu" e "meu" são pronomes frequentes, ou melhor, exclusivos, únicos. O "nosso", o "vosso", o "nós", o "tu", parece que não existem.
É sempre bom lembrar: o dinheiro é ótimo servo e péssimo patrão! Para a eternidade, só se leva o que se partilha, o que se investe para o bem de todos, não o que se acumula para si. Morrer, tendo na conta uma conta muito gorda, sendo proprietário de muitos bens pode acarretar diante de Deus
um juízo severo e exigente. O Deus Trindade que se revela em Jesus é um Deus comunhão, é um Deus que partilha tudo conosco e quer ver isso acontecer entre nós também. Cedo ou tarde chegará esse dia em que o sol deixará de brilhar, ou seja, a nossa vida encontrará o seu crepúsculo, o seu ocaso, estaremos diante do nosso entardecer, terminará a nossa peregrinação terrestre. "Ainda esta noite, pedirão conta da tua vida. E para quem ficará o que tu acumulaste?" (Lc 12, 20). A história é sempre a mesma! Deixa os bens para os herdeiros que irão brigar pela herança!!!! Nem depois de morto, o avarento sossega ou acaba o desassossego de ter acumulado bens!
"Vaidade das vaidades, diz o Eclesiastes, vaidade das vaidades! Tudo é vaidade. Por exemplo, um homem que trabalhou com inteligência, competência e sucesso vê-se obrigado a deixar tudo em herança a outro que em nada colaborou. Também isso é vaidade e grande desgraça" (Ecl 1, 2.2, 21)
Vaidade! Isto é, vazio, fumaça que cedo ou tarde será dispersada pelo vento. Tudo passa, todos passarão. Vaidade, com certeza! Mas, quem partilha a vida, os bens e ama de verdade e concretamente, vive a comunhão e a partilha, celebra a vida e se alegra com o que Deus dá e o que Deus tira, naquela visão de fé e confiança própria de quem é filho, quem a nada se apega, mas a tudo dá o valor que lhe for devido, este não passará, este não vive na vaidade, mas na verdade e por isso, não perecerá, viverá eternidade a dentro. Por isso, com o salmista rogaremos ao Senhor:
Ensinai-nos a contar os nossos dias e dai ao nosso coração sabedoria [Sl 89(90)]
Um abraço para ti, caro Filoteu!
Padre, adorei o seu blog...
Gostaria de lhe pedir para esclarecer sobre o porquê de pedirmos a interseção dos santos... vez por outra os protestantes criticam essa nossa atitude enquanto católicos, alegando que o único intercessor entre a humanidade e Deus é Jesus Cristo... e eu, particularmente, não sei o que responder.
Grata,
Vitória, tudo bem ? Desculpa a intromissão, mas creio que 1 Timóteo cap 2 Vers 3 ao 6 responde sua pergunta. Um abraço.