Os perfumes de Maria encheram toda a casa onde estavam

Oi Filoteu!
Somos mais uma vez convidados a entrar na casa dos amigos de Betânia.

Lugar da acolhida, da hospitalidade. E Nosso Senhor deixou-se amar por esses amigos tão caros ao seu coração. Ele gostava de conviver. Amigos que se querem bem, gostam de conviver, gostam da proximidade, do contato e da convivência. E tu? Vives assim com Jesus? A casa de Betânia! Uma residência, conforme se sabe, foi palco de uma cena sublime, cheia de densos significados. Leiamos o texto (Jo 12, 1-11):

Seis dias antes da Páscoa, Jesus foi a Betânia, onde morava Lázaro, que ele havia ressuscitado dos mortos. Ali ofereceram a Jesus um jantar; Marta servia e Lázaro era um dos que estavam à mesa com ele. Maria, tomando quase meio litro de perfume de nardo puro e muito caro, ungiu os pés de Jesus e enxugou-os com seus cabelos. A casa inteira ficou cheia do perfume do bálsamo. Então, falou Judas Iscariotes, um dos seus discípulos, aquele que o havia de entregar: “Por que não se vendeu este perfume por trezentas moedas de prata, para dá-las aos pobres?” Judas falou assim, não porque se preocupasse com os pobres, mas porque era ladrão; ele tomava conta da bolsa comum e roubava o que se depositava nela. Jesus, porém, disse: “Deixa-a; ela fez isto em vista do dia da minha sepultura. Pobres, sempre os tereis convosco, enquanto a mim, nem sempre me tereis”. Muitos judeus, tendo sabido que Jesus estava em Betânia, foram para lá, não só por causa de Jesus, mas também para verem Lázaro, que Jesus ressuscitara dos mortos. Então, os sumos sacerdotes decidiram matar também Lázaro, porque, por causa dele, muitos deixavam os judeus e acreditavam em Jesus.

Seis dias antes da páscoa, assim diz João. Sua habitual precisão nos permite hoje reviver pontualmente na liturgia a graça dos últimos eventos que preparam a páscoa do Senhor. A ceia de Betânia é uma espécie de anúncio da última ceia. Comer junto com outras pessoas era algo sagrado, indicava comunhão de vida, de ação de graças pela mesma vida. Já pensaste nisso, Filoteu? E hoje raramente se tem tempo para comer junto! A vida moderna tem lá seus fortes desafios para que se construa comunhão. Que significa, então, comer junto com os outros? E participar da mesma mesa eucarística, com Jesus e com os irmãos e irmãs que dela tomam parte?
Lázaro, que fora “ressuscitado dos mortos”, estava próximo a Jesus. Trata-se de uma proximidade que liga à vida e à morte esses dois amigos. Isso! Já pensaste Filoteu? Próximos à vida e próximos à morte de Jesus! Isso é que é discipulado! Mas, a figura de destaque é Maria de Betânia. Seu silencioso e profundo gesto de amor coloca aos pés de Jesus “uma libra de perfume de nardo puro, muito caro”. Maria adorava o querido Mestre com amor adorante, sem cálculos e sem medidas. O perfume derramado sobre os pés de Jesus é por demais precioso: trezentos denários. Essa quantia era o salário de dez meses de um trabalhador braçal. O nardo era um perfume raríssimo, de grande valor, que ordinariamente se encerrava em pequenos vasos de boca estreita e apertada. Quebrar este vaso e derramar o conteúdo sobre a cabeça de alguém, era, entre os antigos, sinal de grande honra e distinção. Maria ofereceu o melhor para Cristo Jesus. Ela não ofereceu um perfume barato, e sim, o melhor e o mais caro. Esse gesto trás ainda o simbolismo forte de Maria de Betânia, enquanto imagem da Igreja-Esposa amorosamente unida ao sacrifício de Cristo-Esposo. Além disso, o enxugou com os cabelos. Sabes bem, Filoteu, que para uma mulher os cabelos têm um significado forte na sua identidade e auto-estima feminina. Esse gesto fez Maria de Betânia viver uma experiência fortíssima de humilhação, de submissão incondicional, de apreço afetivo e efetivo.
E, ante tal gesto, cabe uma pergunta indiscreta e desafiante: E tu, o que

tens oferecido ao teu Senhor? Esse gesto nos faz lembrar o Cântico dos Cânticos quando se diz: “Enquanto o rei está em seu divã meu nardo difunde seu perfume” (Ct 1, 12). Então, caro Filoteu, fiquei a pensar o significado desse nardo, desse perfume tão caro. A meu ver, é a vida dos que amam a Deus. Sim, a vida gasta pela glória de Deus, pelo serviço evangelizador. Uma vida consumida assim, é perfume derramado que tem um efeito muito forte: “e a casa ficou cheia do perfume do bálsamo”. Isso me faz lembrar o que o apóstolo diz: “Em verdade somos para Deus o bom odor de Cristo, entre aqueles que se salvam e aqueles que se perdem; para uns odor que da morte leva à morte; para outros, odor que da vida leva à vida” (2Cor 2, 15-16). Aqui, Filoteu, dá pra entender que João coloca na contramão da amiga de Betânia, a figura sinistra e fracassada do discípulo medíocre e afundado na mesquinharia. De fato, Judas Iscariotes disse: “Por que não se vendeu esse perfume por trezentos denários para dá-los aos pobres?” Eis um coração fechado! Pelo visto, Judas já desistiu de Jesus já fazia tempo. Pequenas ou grandes infidelidades foi pouco a pouco tornando opaca ou sem graça a figura do Mestre. Seus roubos e outras faltas voluntárias foram deixando a pessoa de Jesus um alguém sem valor. Não valia à pena segui-lo. A prova disso é ele ter achado um desperdício o gesto de Maria de Betânia. Mas, o Iscariotes não hesitou em vender Jesus por trinta moedas, o preço que valia um escravo. Não valia mais à pena seguir o Senhor.
Oferecer a vida da melhor forma, sendo o que somos chamados a ser, dedicados e fervorosos, zelosa e amorosamente fiéis e fazer tudo muito bem feito e com grande amor para honrar a Majestade divina, defender a verdade revelada e ensinada pelo Magistério da Igreja, eis as formas bastante concretas de honrar o Senhor e derramar o melhor perfume. Perfume de boa qualidade é aquele que mais custa. Quais os custos de tua oferta? São altos? Mas, sobre quem derramarás esses perfumes? Essa última pergunta faz toda a diferença para arcar com os altos custos. Faço minhas as palavras de São Bernardo de Claraval nos seus comentários ao Cântico dos Cânticos: “Deus queira que (...) que (eu) possa ver-vos ricos em virtude, fervorosos nos louvores de Deus, repletos sempre mais abundantemente desse ungüento espiritual, em Cristo Jesus Nosso Senhor” (Dos comentários sobre o Cânticos dos Cânticos, Sermão X, n. 10).
Um abraço e bênção para ti!