Oi Filoteu!
Ele caiu do cavalo! Ou foi do burro? ou do camelo? (esses eram as montarias usadas na época. Tu sabes que não existiam veículos automotivos, ou seja, carros ou motos, nem muito menos aviões!). Bem, só sei que ele caiu por terra e viveu uma experiência forte, marcante.
Não sei se deu curiosidade, mas o personagem de quem me refero é Saulo, de Tarso, que por ocasião da viagem para Damasco era chamado Saulo. Conta a Bíblia que ele tinha raiva dos cristãos. E na dita viagem, viveu uma experiência muito forte: Caiu por terra e "refulgiu em volta uma luz do céu, e, caindo por terra, ouviu uma voz que lhe dizia: 'Saulo, Saulo, por que me persegues?' Ele respondeu: 'Quem és tu, Senhor?' Ele retorquiu: 'Eu sou aquele Jesus a quem tu persegues! Ergue-te, porém, e entra na cidade e ser-te-á dito o que deves fazer" (At 9, 4-6). Um pouco mais adiante, o texto relata a situação de Paulo após ter contemplado tanta luz: "Saulo, ergueu-se então da terra, mas abertos os olhos, nada via. Levando-o pela mão, conduziram-no a Damasco" (At 9, 8).
Filoteu, essa passagem fala da conversão de um grande personagem que marcou profundamente o cristianismo. E tudo isso porque esse personagem deixou-se seduzir por Cristo, foi uma alguém, digamos, cristificado. Pensaste uma coisa curiosa? Paulo nunca viu Jesus pessoalmente, antes dessa aparição luminosa. Então, como é que Jesus fez essa queixa dizendo-se perseguido? Onde Saulo, o judeu rigoroso e zeloso perseguiu o tal do Mestre dos cristãos? Pois é, aqui vê-se a grande mensagem: "(...) tudo o que fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes" (Mt 25, 40). É isso aí, Filoteu. É isso aí! Jesus está no próximo, especialmente nos mais simples e humildes entre seus discípulos. Somente uma fé madura e constante, uma caridade viva e operosa vai permitir que se veja Cristo nas pessoas. Sem as lentes da caridade e da fé, isso não é possível. Perseguir o próprio Cristo! Isso é possível. Se não nos deixarmos transformar por Ele, se não perseverarmos em deixar-nos iluminar pela luz de sua ressurreição, correremos o sério risco de dar mau exemplo, de ser um contratestemunho, de rejeitar as pessoas ou nos fecharmos ao projeto de Deus. Quem sabe, essa escuridão nos levará a não querer viver a conversão que nos tira dessas trevas. Daí já viu: corremos o sério risco de nos afastarmos de Deus e consciente ou inconscientemente estaremos perseguindo as pessoas, pelo mau exemplo. Sutiu, não é? Mas, é o que acontece, ou pelo menos, pode acontecer!
Tanta luz, deixou o pobre Saulo cego. Fiquei cá com meus botões pensando o que viria a ser tal cegueira. Pensei que tal se deve ao fato que Paulo iria enxergar o mundo, a vida, as pessoas de um outro jeito, a partir de uma perspectiva totalmente diferente. Recordo algo que já comentei uma certa vez: a gente vê as coisas com o cérebro! a visão, a vista cumpre a missão de ser as lentes através das quais as imagens são conduzidas ao cérebro. Viu aí Filoteu? Entendeu? É uma questão de como se vê, qual leitura se faz do que se vê! Deus nos dê a cegueira para toda forma errada ou distorcida e nos dê uma visão limpa, pura,simples, profunda, nunca superficial ou leviana a respeito das coisas, das pessoas, dos acontecimentos, das instituições, enfim, de tudo o que nos rodeia ou nos diga respeito.
Ele caiu por terra! Ele ficou cego e foi conduzido pela mão! Pronto, outro ponto! Ser conduzido por outras pessoas é muito importante, pois nem sempre conseguimos ver bem o caminho. As vezes, o orgulho bate e aí já viu: sou adulto, não vou me submeter, já posso caminhar com minhas próprias pernas e pensar com minha cabeça, etc. Apesar disso, lanço uma reflexão: Quando Deus nos coloca autoridades, professores, formadores e demais instrumentos da sua luz, da sua sabedoria ou da sua condução, é preciso que a gente não dê uma de orgulhoso ou menino birrento e bicudo para deixar-se formar e conduzir. Pra onde? Para onde Deus nos quer levar. Deus gosta que nós acolhamos e respeitemos as mediações (ou seja, os instrumentos) que ele nos envia para que se descubra e se cumpra com mais segurança a sua vontade.
Do fã clube desse apóstolo, tem um membro chamado São João Crisóstomo, um bispo que viveu no IV século e fez um discurso muito edificante sobre São Paulo. Diz o bispo:
"O que é o homem, quão grande é a dignidade da nossa natureza e de quanta virtude é capaz a criatura humana, Paulo o demonstrou mais do que qualquer outro. (...). (...) corria ao encontro das humilhações e das ofensas que suportava por causa da pregação, com mais entusiasmo do que nós quando nos apressamos para alcançar o prazer das honrarias: aspirava mais pela morte do que nós pela vida; ansiava mais pela pobreza do que nós pelas riquezas; e desejava muito mais o trabalho sem descanso do que nós o descanso depois do trabalho. Uma só coisa o amendrontava e fazia temer: ofender a Deus. E uma única coisa desejava: agradar a Deus.
Só se alegrava no amor de Cristo, que era para ele o maior de todos os bens; com isso julgava-se o mais feliz dos homens; sem isso, de nada lhe valia ser amigo dos senhores e poderosos. Com este amor preferia ser o último de todos, isto é, ser contado entre os réprobos, do que encontrar-se no meio dos homens famosos pela consideração e pela honra, mas privados do amor de Cristo".
É isso aí, Filoteu! Que Deus te faça ver, na sua luz, a verdade que brota de sua revelação e ressurreição!
Um abraço e bênção!