"Ninguém pode receber alguma coisa, se não he for dada do céu. Vós mesmos sois testemunhas daquilo que eu disse: 'Eu não sou o Messias, mas fui enviado na frente dele' ". (Jo 3, 27-28).
Oi Filoteu!
Achei de grande importância estas palavras, repletas de uma sabedoria luminosa, cheia da mais densa verdade. Achei por bem, partilhar contigo a riqueza que ela porta. Foram palavras ditas por João Batista, o precursor do Messias. Há uma verdade fundamental: tudo o que temos recebemos.
O rei Davi afirmou algo, em um momento litúrgico, no templo que trás estas marcas fortes: "Agora, pois, ó nosso Deus, nós te celebramos, louvamos o vosso nome glorioso; pois quem sou eu e que é meu povo, para sermos capazes de fazer tais ofertas voluntárias? Porque tudo vem de ti e te ofertamos o que recebemos de tuas mãos" (1 Cro 29, 13-14). Além disso, o apóstolo Paulo diz com muito realismo e grande autoridade: "Pois, quem é que te distingue? Que é que possuis que não tenhas recebido?" (1Cor 4, 7). Faz-me lembrar de Agostinho, quando na sua oração dizia para Deus: "Dá-me o que me pedes e pede-me o que quiseres" (Confissões).
Tudo isso, faz pensar. Não somos donos de nada e de modo algum poderemos o senso de propriedade ou o instinto e posse deve encontrar em nós tanta abertura ou tanta falta de vigilância, ao ponto de que venhamos a esquecer nosso papel ante todos os bens: administradores, não proprietários. E isso se confirma no fato que no dia da morte, tudo e todos passarão. Digo brincando e falando sério que o cemitério está cheio de insubstituíveis enterrados por lá.
Parece doidice para uma corrida que se tem em acumular coisas (bens materiais, dinheiro), dominar ou influenciar pessoas, mostrar um currículo cheio de muitos títulos, ter o domínio de tantos conhecimentos e quem sabe, sentir-se seguros até mesmo por uma santidade que se alcançou em função de vícios e pecados presumidamente e quem sabe, até efetivamente superados. Donos, proprietários, senhores, bem, tudo isso é ilusão. Não o somos e nem adiante espernear. No dia da morte entregaremos tudo ao proprietário legítimo e doador de todos os dons. Com os dons somos chamados a cumprir nossa missão, fazer o bem, viver o projeto de Deus. Olha Filoteu, não quero te fazer propostas bizarras ou meio esquisitas para o nosso tempo. Um exemplo destes hábitos, eram aqueles que os religiosos tinham de ter uma caveira no quarto para meditar a morte. Mas, acho interessante, pensar que, o fim último chegará, tal é sempre saudável e nos ajuda a não nos enganar com aquilo que passa. Fica mais fácil para vencer o orgulho e seus terríveis tentáculos, a vaidade desaparece como a névoa ante o brilho do sol da divina verdade. Vale recordar o que o apóstolo João nos ensina: "Ora,o mundo passa com suas concupiscências; mas o que faz a vontade de Deus permanece eternamente" (1Jo 3, 17).
E por fim: "Eu não sou o Messias". Essa frase de São João Batista é arrasante! Triturante! Só o power elevado à enésima potência meteorítica em escala infinitesimal. Não quero perder a oportunidade de repetir muito sobre isso. Acho que preciso ouvir. Preciso saber, todos precisam e assumir essa consciência libertadora, iluminadora. Eu não sou o Messias, tu não és o Messias, ele não é o Messias, nós não somos o Messias, Vós não sois e Eles não são o Messias. Que bom. Evita confusão de papéis. O orgulho ou certos tipos de altivez ou de presunção nos fizeram pensar bobagens ou agir de forma insensata. A inteligência da fé nos levará a evitar tantas intelijumências mequetrefes e burroligências escorbúticas. Não tente ser um messias na vida de sua comunidade, nem das pessoas, nem da Igreja, nem do mundo. Sejas tu um mero colaborador do Messias, ou seja, de Jesus. Viver por Ele, n'Ele e com Ele, viver na sua vontade e trilhar essa experiência maravilhosa de ser seu amigo, irradiando-O para as pessoas, olha Filoteu isso sim, te ajudará a seres o que és! Acho que isso ilumina e liberta. O resto é engano, enrolação, embaçamento. Sabes aquelas estradas que levam nada a lugar nenhum? Pois bem, é quando queres ser o caminho. E o caminho é som um. O resto é atalho.
Abraço e bênção
Pe. Marcos.